IGSD

Institute for Governance & Sustainable Development

O fruto maduro do Clima

Por Patricia Espinosa e Mario Molina 

09 de setembro de 2016

Este editorial foi originalmente publicado no Project Syndicate.

Nova Iorque – No próximo mês signatários do Protocolo de Montreal sobre Substâncias que Destroem a Camada de Ozônio de 1989 se reunirão em Kigali, Ruanda, para considerar uma emenda ao tratado para reduzir gradualmente e, eventualmente, eliminar a utilização de hidrofluorocarbonetos. Os HFCs, são um dos seis principais gases de efeito estufa e são comumente usados em aparelhos de ar condicionado e sistemas de refrigeração em todo o mundo.

A emenda seria um grande ganho para o desenvolvimento sustentável, e poderia impedir a emissão de algo entre 100 e 200 bilhões de toneladas de emissões que alteram o clima até 2050. Isso seria o suficiente para eliminarmos um quarto do caminho para alcançar a meta-alvo fixada em dezembro de 2015 pelo acordo climático Paris de 2º Celsius.

O Protocolo de Montreal foi criado para reparar a camada de ozônio que protege toda a vida no planeta em relação aos níveis mortais de raios ultravioleta. Até agora, tem sido um sucesso notável, com cerca de 100 produtos químicos que destroem a camada de ozono eliminadas ao longo das últimas três décadas. A camada de ozônio está se recuperando e, de acordo com as últimas estimativas, poderia estar plenamente recuperada até 2065, salvando trilhões de dólares em custos globais de cuidados com a saúde e a agricultura.

Grande parte desta melhoria é graças ao HFCs, que são excelentes alternativas amigáveis à camada de ozônio para os antigos, e já eliminados, clorofluorocarbonetos (CFC). No entanto, os HFCs, que são gases de efeito estufa até 4.000 vezes mais potentes do que o dióxido de carbono (CO2), são um desastre para as mudanças climáticas, e seu uso está aumentando cerca de 10% ao ano.

Assim, faz sentido nos concentrarmos nos HFCs na tomada de medidas para conter as mudanças climáticas. Para começar, reduzi-los pode render benefícios econômicos devido às melhorias significativas de eficiência energética que podem ser alcançados com sistemas de ar condicionado e refrigeração mais modernos. Apenas migrar para sistemas de ar condicionado mais eficientes seria capaz de evitar as emissões de gases de efeito estufa equivalentes a aposentar 2.500 usinas termelétricas de pico médias (usinas de energia que entram em operação durante os períodos de alta demanda, como durante o verão).

Na China, a mudança para refrigerantes favoráveis ao clima e o aumento na eficiência energética de aparelhos de ar condicionado e refrigeração poderia levar a economia de emissões equivalente a oito hidrelétricas Três Gargantas. Na Índia, a mudança pode ser igual a duas Missões Solares do governo indiano, que promove a penetração de energia solar e a construção de telhados solares e fazendas de energia solar.

Muitos países – incluindo a União Europeia e os EUA, bem como Belize, Burkina Faso, Colômbia, Egito, Sérvia e Iêmen – já reconhecem estes benefícios de longo prazo e estão tomando medidas unilaterais para eliminar progressivamente os HFCs. Um acordo forte sobre os HFCs em Kigali daria impulso a estes esforços e forneceria apoio financeiro aos países que querem migrar para novas tecnologias em desenvolvimento, mas não podem pagar no momento.

No setor privado, gigantes do varejo, como Walmart, Nestle e Tesco aderiram ao Consumer Goods Forum, uma iniciativa de cooperação em matéria do clima, e concordaram em eliminar progressivamente os produtos com HFCs. As Nações Unidas e o Greenpeace, através de uma iniciativa chamada “Refrigerantes, naturalmente!”, estão trabalhando com a Coca-Cola, Pepsico, Redbull e Unilever para fazerem o mesmo.

A reunião de Kigali está pronta para produzir uma emenda forte em relação aos HFCs. No entanto, alguns países com climas especialmente quente temem que as alternativas para o ar condicionado, que para eles é essencial, não funcionem tão bem. Qualquer acordo pode resolver essas preocupações por meio de uma isenção temporária para esses países, enquanto os outros avançam com novos sistemas para demonstrar a sua eficácia.

Nosso planeta em aquecimento já está a tendo um impacto devastador sobre algumas das populações mais vulneráveis do mundo, e isso só vai aumentar. Em última análise, todos os países terão de encontrar uma maneira de avançar na redução dos HFCs e das mudanças climáticas em geral através de planos de ação nacionais e das reduções de emissões acordadas no Acordo de Paris de 2015. Frameworks estabelecidos por acordos irmãos, como o Protocolo de Montreal podem ajudar a fazer isso.

HFCs também será um tema central na próxima conferência sobre mudanças climáticas da ONU, COP22, que se reúne em Marrakesh, Marrocos, em novembro. Estamos confiantes de que os governos que se preparam para se reunir em Kigali compreendem a necessidade de uma emenda forte em relação ao HFCs, o que daria impulso para outros itens da agenda, tais como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, em Marrakesh.

Se o mundo quer realmente ter sucesso reduzindo rapidamente as emissões globais para evitar que as alterações climáticas atinjam níveis catastróficos, a redução progressiva dos HFCs é um sensato – talvez o mais sensato – primeiro passo.

Patricia Espinosa é a Secretária Executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima.

 

Mario Molina dividiu o Prêmio Nobel de Química em 1995 por seu trabalho sobre gases prejudiciais à camada de ozônio.